[Resenha] “O avesso da pele” escancara racismo
Lançado em agosto, livro de Jeferson Tenório narra a história de pai e filho. Obra traz questões relacionadas à negritude e violência
O avesso da pele, de Jeferson Tenório, é um dos principais destaques da literatura brasileira contemporânea, em 2020. Em seu terceiro romance, o escritor traz questões sobre negritude, violência e relações familiares. Nesta obra, o jovem negro Pedro narra a história de seu pai, Henrique, morto em uma desastrosa abordagem policial em Porto Alegre. Ele tenta resgatar as memórias e a trajetória de seu pai, um professor de literatura, ao mesmo tempo em que também relembra o passado da mãe, Martha.
Ao contar essa história, Jeferson Tenório descreve todo um contexto de racismo que permeou a vida dos pais de Pedro. Brutal, a narrativa torna-se ainda mais incisiva ao ser narrada em terceira pessoa em todas as partes sobre o pai. Dessa forma, é como se Pedro falasse diretamente com ele e tentasse se colocar no lugar de Henrique em todos os acontecimentos, para nos transmitir seus pensamentos e emoções.
Um dos trechos mais marcantes do livro é quando Pedro relembra que o pai já havia sofrido outras sete abordagens policiais durante a vida. Uma delas ocorreu na juventude, quando Henrique fez amizade com um amigo que morava em um bairro de classe alta de Porto Alegre. Enquanto esperava o amigo do lado de fora do prédio, um policial o abordou e o “mandou circular”.
“Ao chegar, você apertou a campainha e esperou. Pessoas passavam por você na rua e te olhavam. Ninguém respondeu no interfone. (…) Decidiu ficar ali na frente do prédio e pensou que ele poderia ter saído com a mãe dele. No entanto, em minutos, surgiu o policial da Brigada Militar ao seu lado dizendo para você circular que ali não era lugar para pedir coisas”, diz uma das partes.
Sobre o autor
Nascido em 1977, no Rio de Janeiro, Jeferson Tenório é radicado em Porto Alegre e doutorando em Teoria Literária pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). O escritor estreou na literatura, em 2013, com o livro O beijo na parede, eleito o Livro do Ano pela Associação Gaúcha de Escritores. É autor também de Estela sem Deus, lançado em 2018.
Veja também outros livros relacionados ao tema. Boa leitura!
Pequeno manual antirracista, de Djamila Ribeiro
Neste pequeno manual, a filósofa e ativista Djamila Ribeiro trata de temas como atualidade do racismo, negritude, branquitude, violência racial, cultura, desejos e afetos. Em 11 capítulos curtos e contundentes, a autora apresenta caminhos de reflexão para aqueles que queiram aprofundar sua percepção sobre discriminações racistas estruturais e assumir a responsabilidade pela transformação do estado das coisas.
A cor púrpura, de Alice Walker
A personagem principal, Celie, negra, semianalfabeta, vivendo no Sul dos Estados Unidos, vive entre cuidar da família e planejar uma vida diferente da sua para a irmã, Nettie. Acompanhamos sua vida por mais de trinta anos, por meio das cartas que escreve para Deus e, posteriormente, para a irmã. Em oposição à solidão, pobreza, brutalidade e violência, Celie vai descobrir outras maneiras de sentir.
Se a rua Beale falasse, de James Baldwin
Tish tem 19 anos quando descobre que está grávida de Fonny, de 22. A sólida história de amor dos dois é interrompida bruscamente quando o rapaz é acusado de ter estuprado uma porto-riquenha, embora não haja nenhuma prova que o incrimine. Convicta da honestidade do noivo, Tish mobiliza sua família e advogados na tentativa de libertá-lo da prisão. Se a rua Beale falasse é um romance comovente que tem o Harlem da década de 1970 como pano de fundo. Ao revelar as incertezas do futuro, a trama joga luz sobre o desespero, a tristeza e a esperança trazidos a reboque de uma sentença anunciada em um país onde a discriminação racial está profundamente arraigada no cotidiano.
Racismo estrutural, de Silvio Almeida
Nos anos 1970, Kwame Turu e Charles Hamilton, no livro Black Power, apresentaram pela primeira vez o conceito de racismo institucional: muito mais do que a ação de indivíduos com motivações pessoais, o racismo está infiltrado nas instituições e na cultura, gerando condições deficitárias a priori para boa parte da população. É a partir desse conceito que o autor Silvio Almeida apresenta dados estatísticos e discute como o racismo está na estrutura social, política e econômica da sociedade brasileira.
Um defeito de cor, de Ana Maria Gonçalves
No final do século XIX, Kehinde, uma africana idosa, cega e à beira da morte, viaja da África para o Brasil em busca do filho perdido há décadas. Ao longo da travessia, ela vai contando sua vida, marcada por mortes, estupros, violência e escravidão. Neste romance, os fatos históricos estão imersos no cotidiano e na vida dos personagens, criando a saga emocionante e verossímil da história de Kehinde.
Americanah, de Chimamanda Ngozi Adichie
Enquanto Ifemelu e Obinze vivem o idílio do primeiro amor, a Nigéria enfrenta tempos sombrios sob um governo militar. Em busca de alternativas às universidades nacionais, paralisadas por sucessivas greves, a jovem Ifemelu muda-se para os Estados Unidos. Ao mesmo tempo que se destaca no meio acadêmico, ela se depara pela primeira vez com a questão racial e com as agruras da vida de imigrante, mulher e negra. Quinze anos mais tarde, Ifemelu é uma blogueira aclamada nos Estados Unidos, mas o tempo e o sucesso não atenuaram o apego à sua terra natal, tampouco anularam sua ligação com Obinze.
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