Jack Kerouac, o porta-voz da Geração Beat
O poeta transgressor da Geração Beat nascia há 96 anos.
Uma aventura libertária sobre rodas é o que o icônico escritor Jack Kerouac (1922-1969) ofereceu a uma geração inteira de leitores. Criador da famosa dupla Dean Moriarty e Sal Paradise, o escritor foi um marco para a prosa selvagem e experimental. Sua vida foi uma verdadeira montanha russa, que com certeza deu fôlego aos livros. O mais famoso de todos, “On the road“, foi lançado em 1957 – após ser rejeitado por quase 10 anos por editoras. Inspirado pelo jazz e andanças na costa oeste do país, Kerouac escreveu em três semanas a primeira versão do que seria a bíblia da contracultura norte-americana, a base de muita benzedrina e café.
Na trama, o autor captou a sonoridade das ruas, das planícies e das estradas americanas para criar uma obra que influenciou a arte e o comportamento da juventude na segunda metade do século XX. Embora seja um livro de ficção, todos os personagens são reais, inspirados nos amigos de Jack, mas em versões romantizadas. Kerouac retratou a si mesmo no papel de Sal Paradise, um personagem neutro e de segundo plano, fascinado por Dean Moriarty, que na vida real era o ícone dos poetas da época, Neal Cassady. O livro foi adaptado para o cinema pelo cineasta brasileiro Walter Salles, em 2012 e, no Brasil, recebeu impecável tradução e introdução de Eduardo Bueno para a L&PM Pocket.
A história completa
Após o grande sucesso, Kerouac ganhou um enorme protagonismo – diferente do livro – que foi evidenciando algumas incongruências entre sua história e seu estilo de vida. O início do descompasso entre os hippies e o autor, se deu quando Kerouac iniciou um discurso antissemita, apoiou a Guerra do Vietnã e a apresentou sua tendencia reacionária de direita.
Em meio à liberdade sexual e ao uso deliberado das drogas, o escritor já era um modelo ultrapassado, o que o fez enveredar, sem volta, num martírio alcoólico enclausurado na casa de sua mãe, onde viveu até morrer. Na biografia: Jack Kerouac – King of the beats, o autor Barry Miles conta muitos detalhes dessa história. Miles foi um dos maiores pesquisadores da Geração Beat e amigo pessoal de Allen Ginsberg (1926-1997). Na década de 1970, escreveu também as biografias de Ginsberg e de William Burroughs – também representados em On the road, como Carlo Marx e Old Bull Lee.
Ao todo, Jack Kerouac escreveu 20 livros de prosa sendo Visões de Cody, considerado por muitos o melhor e mais radical livro, esse só foi publicado integralmente em 1972, três anos pós sua morte em St. Petersburg, Flórida, aos 47 anos, de cirrose hepática.
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Mulheres da geração beat
A partir de um olhar mais distanciado da obra, é possível ter uma visão menos romantizada sobre o estilo de vida do grupo de Sal. E essa crítica é sentida pelo próprio Paradise, ao narrar as situações absurdas que as companheiras dos jovens eram submetidas, inclusive, acompanhadas dos filhos.
Ainda além das narrativas, dentro do próprio movimento literário, as escritoras beats foram deixadas ao ostracismo ou lembradas apenas como as namoradas dos escritores. O poeta beat Gregory Corso deu uma declaração sobre o fato no livro “A Geração Beat”, de Cláudio Willer:
Houve mulheres, estiveram lá, eu as conheci, suas famílias as internaram , elas receberam choques elétricos. Nos anos de 1950, se você era homem, podia ser um rebelde, mas se fosse mulher, sua família mandava trancá-la. Houve casos, eu as conheci, algum dia alguém escreverá a respeito.”
Mas não é preciso esperar alguém escrever a respeito delas. Há livros traduzidos para o português das beatniks. Um exemplo é a escritora, Diane Di Prima com o autobiográfico “Memórias de uma beatnik”, de 1969.