Sonhos distópicos: uma linha do tempo da ficção científica feita por mulheres
De Mary Shelley até Margaret Atwood, até onde vai a ficção?
Após a última eleição presidencial dos Estados Unidos, reacenderam, em várias partes do mundo, a procura por romances distópicos. O presidente Trump, mesmo sem querer, deu uma boa contribuição ao mercado literário, após sua ascensão à Casa Branca. Tudo por conta de leitores que ainda tentam entender a onda conservadora que dominou o país. Livros como 1984, de George Orwell, e O complô contra a América, de Philip Roth – clássicos atemporais – foram alguns dos mais procurados.
No entanto, o mais curioso foi o fortalecimento de autoras, até então pouco conhecidas do grande público, mas que escreveram histórias sobre mundos totalitários, onde as mulheres teriam seus direitos restritos, os avanços feministas seriam destruídos e elas seriam vistas apenas como procriadores da espécie, no grande estilo MadMax.
Uma das principais expoentes desse universo e que agora volta a evidência, 30 anos após o lançamento de sua obra-prima O conto da aia, é a autora Margaret Atwood. Publicado em 1985, o romance distópico da escritora canadense não poderia ser mais oportuno, refletindo sobre um futuro onde o aborto é proibido e as mulheres são reduzidas a meras serviçais. O conto da aia já ganhou adaptação para a televisão e neste mês estreia como série pelo serviço de streaming Hulu.
No momento em que essas questões voltam ao debate político e são levantadas por mulheres marchando no mundo inteiro, algumas obras ainda inéditas no mercado brasileiro começaram a aparecer por aqui, como é o caso do livro Dicas da imensidão – coletânea de contos de Atwood lançada, em 1991 – e que acaba, finalmente, de ser publicada no país.
A partir desses títulos, vale a pena dar um passo atrás e lembrar quais outras autoras construíram histórias, olhando para além do momento histórico em que viviam e ganhando o status de profetas de nosso tempo. Confira!
Frankenstein, de Mary Shelley
Eles o escorraçavam de todos os ambientes como se ele fosse um monstro. Ninguém queria saber de seus sentimentos, nem ligava para o fato de que talvez ele tivesse uma alma. Foi então que ele começou a matar. Bem, vamos ser justos: ele era mesmo um monstro, mas tinha motivos para isso. E foram esses motivos que o tornaram o personagem mais importante da literatura de horror. Uma expressão de como os homens poderiam “dar à luz” e o que aconteceria com eles.

Herland, de Charlotte Perkins Gilman
No livro de Gilman, três arrogantes exploradores homens descobrem uma civilização perdida povoada inteiramente por mulheres.

Anthem, de Ayn Rand
Anthem, publicado pela primeira vez em 1938, é uma história que se passa em uma época não especificada, quando a humanidade entrou em outra Idade das Trevas, como resultado dos males da irracionalidade e do coletivismo. O avanço tecnológico está agora cuidadosamente planejado (quando é permitida em todos) e o conceito de individualidade foi eliminada. Por exemplo, a palavra “eu” desapareceu da linguagem. O romance de ficção científica foi vencedor do Prêmio Prometheus.

Leia também: Origens do totalitarismo, de Hannah Arendt
Neste livro, concebido na década de 40 e publicado em 1951, Hannah Arendt realça a singularidade do totalitarismo, como uma nova forma de governo baseada na organização burocrática de massas e apoiada no emprego do terror e da ideologia. Sublinha como a ubiquidade do medo e a descartabilidade generalizada das pessoas, que permitiu, com o nazismo na Alemanha e o stalinismo na URSS, a dominação total, não é um despotismo oriental – sempre visto pela teoria política clássica e moderna como algo que se origina de fora -, mas sim a inesperada terrível outra face da modernidade ocidental, que também ensejou a democracia, a prosperidade econômica e os direitos humanos.
Apesar de não se tratar de ficção científica, a incisiva e inesgotável sugestividade do abrangente pensamento de Hannah Arendt torna este livro ponto de referência indispensável para a reflexão político-filosófica no mundo contemporâneo. Clareando a compreensão das outras leituras.

A mão esquerda da escuridão, de Ursula K. Le Guin
Genly Ai foi enviado a Gethen com a missão de convencer seus governantes a se unirem a uma grande comunidade universal. Ao chegar no planeta Inverno, como é conhecido por aqueles que já vivenciaram seu clima gelado, o experiente emissário sente-se completamente despreparado para a situação que lhe aguardava. Os habitantes de Gethen fazem parte de uma cultura rica e quase medieval, estranhamente bela e mortalmente intrigante. Nessa sociedade complexa, homens e mulheres são um só e nenhum ao mesmo tempo. Os indivíduos não possuem sexo definido e, como resultado, não há qualquer forma de discriminação de gênero, sendo essas as bases da vida do planeta. Mas Genly é humano demais. A menos que consiga superar os preconceitos nele enraizados a respeito dos significados de feminino e masculino, ele corre o risco de destruir tanto sua missão quanto a si mesmo.

Dicas da imensidão, de Margaret Atwood
A história de mulheres confrontando seus monstros. De jovens em colônias de férias com nomes indígenas a poetas de saraus em cafeterias antiburguesas e profissionais bem-sucedidas dos escritórios de Toronto, Margaret Atwood apresenta em Dicas da imensidão dez contos que, ao recuperarem acontecimentos transformadores do passado – recente e distante – de cada uma de suas protagonistas, e seus ecos no presente, convidam a uma reflexão sobre escolhas, chances perdidas e sobrevivência. Manejando com extrema habilidade os sentimentos, desejos, as frustrações e memórias de suas personagens, a escritora conduz o leitor por uma teia de histórias que falam da beleza e do mistério da condição humana.

A fêmea da espécie, de Joyce Carol Oates
A fêmea da espécie reúne nove perturbadores contos de Joyce Carol Oates, uma das maiores romancistas da literatura contemporânea norte-americana. No livro, diversas mulheres se deparam com o mal ao seu redor e se surpreendem com a maldade que descobrem em si mesmas. Dona de uma visão perversamente penetrante, a autora demonstra por que as fêmeas da nossa espécie – sejam meninas de 6 anos, esposas aparentemente dedicadas, ou mães idosas – são por natureza mais mortíferas do que os machos.

Os lança-chamas, de Rachel Kushner
O ano é 1975 e Reno – uma jovem recém-formada que ganhou esse apelido por causa de sua cidade natal – acaba de se mudar para Nova York disposta a transformar em arte seu fascínio por motocicletas e velocidade. Sua chegada coincide com um período de ebulição no mundo artístico de Manhattan – pintores, escultores, fotógrafos, videomakers e agentes estão começando a colonizar a até então deserta e industrial região do SoHo, a desenvolver ações no East Village e a confundir os limites entre vida real e arte. Passional, vulnerável e corajosa, Reno se junta a um grupo que a submete a uma espécie de educação sentimental. Ela logo começa a namorar um artista plástico chamado Sandro Valera, herdeiro distante de um império de pneus e motocicletas italianos. Quando eles visitam a família de Sandro na Itália, Reno se vê envolvida com membros dos movimentos radicais que tomaram conta daquele país nos anos 1970, e uma traição a jogará nos submundos da clandestinidade. Ao questionar o entusiasmo juvenil e suas consequências, Rachel Kushner se lança em uma investigação intensa e envolvente sobre a mística do feminismo, da arte e do terrorismo. No centro de tudo está uma protagonista – uma jovem mulher vivendo no limite.

Qual outro título você acrescentaria a lista? Comente e participe!
Oi pessoal
Esse site é mesmo surpreendente, queria dar os parabéns pelo trabalho de vocês.
Sempre é bom obter novos conhecimentos, obrigado 😉
Exelente o artigo de vcs, estão de parabéns, ótimo conteudo! Obrigada!!!
Depois a galera fala que é perseguição, mas cadê a Octavia E. Butler? Que bola fora :/
Interessante.
Nossa, muito completo esse conteúdo. Obrigada por compartilhar
Excelente post! 🙂